quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Com esparregado?
Quando era puto eu não gostava de esparregado. Julgava eu. Quando era puto eu não sabia nada de comidinha. Hoje sei pouco, mas sei o suficiente para não dispensar esparregado. E por mim comia esparregado com tudo. Como as coisas mudam. Tenho quase mais dez quilos do que tinha há quatro anos. Mas isso não tem nada que ver com as minhas caminhadas de uma hora e picos até casa. Faço-o porque a cidade é bonita, porque ando a passar no Palladium todos os dias à procura da Monocle, que este mês traz um artigo sobre Lisboa, porque as noites estão amenas, e porque ando a ver quando é que me apaixono por uma turista linda e de pernas longas, daquelas que vejo no caminho de vez em quando, a descer a avenida do Tivoli ou do Sofitel. É que faz agora duas semanas que vi uma estrela cair e pedi um desejo, logo, nem demorei mais de trinta segundos a pensar, tem de ser logo de seguida, e eu pedi.


Para fazer esparregado começa por se ferver os espinafres, que é diferente de cozê-los, depois de os comprar no mercado ao sábado de manhã. Não confio nos espinafres do Pingo Doce ou do Continente, e do A. C. Santos simplesmente não confio em nada que não esteja embalado — sou um gajo desconfiado. Deita-se os espinafres fervidos e bem escorridos num refogado de azeite e alho, que é estrugido acima de Leiria, o alho cortado fininho e apenas alourado, que há poucas coisas piores do que o sabor de alho queimado. O cheiro a alho nas mãos suporta-se. Mexe-se os espinafres e junta-se farinha e leite a olho, sempre mexendo, até ganhar a consistência pretendida, e não esquecendo o sal e a pimenta, com parcimónia, que esparregado salgado não tem piada e doce demais também não. Se vos disserem que na vez do leite pode juntar-se natas, soltem uma gargalhada forte e depois metam uma cara séria e um olhar impiedoso. Se vos disserem que é costume deitar-se umas gotinhas de limão, levantem só o sobrolho — é uma questão de paladar.


No H3 pode comer-se hambúrguer no prato com esparregado, em vez do arroz ou das batatas fritas que são às rodelas e cheias de gordura, para mostrar que não vêm do pacote. O H3 é aquele restaurante de hambúrguer gourmet, no que tem de restaurante uma casa que está nos centros comerciais de norte a sul do país, e que se apregoa not so fast food. O hambúrguer é alto, da grossura de um dedo e meio, dos meus, e diz que são duzentas gramas de carne de novilho, que vai à chapa no ponto que o cliente desejar. Para mim é médio, e foi mesmo médio, em cheio, o exterior durinho sem estorricar, o interior cor de rosa sem sangrar. Pela consistência do hambúrguer, que não se desfez ao cortar, por oposição àqueles que fazemos em casa com carne picada ou que compramos feitos, frescos, no supermercado, que ao primeiro encosto da faca já se vão esboroando, pela consistência o hambúrguer é decerto processado industrialmente — ok, não há milagres —, mas não se pense que isto é mau. E esta frase foi alterada, porque eu tinha escrito certamente processado industrialmente, mas depois achei que ficava mal.


O hambúrguer vem com duas fatias de queijo amarelo por cima, um borrão de ketchup e outro de maionese com sementes de mostarda, ao lado, e um tufo de cebola frita com qualquer coisa, que aquele docinho não é genuíno. Este é o sexto da lista, o H3 Cheese. Os outros são todos afogados em molhos de cogumelos, à portuguesa ou holandês. O esparregado pareceu-me congelado, algo líquido, mas, como dizem os próprios, é feito de espinafres. A limonada, demasiado doce, deixou-me na dúvida — espremida ou da garrafa? Para esclarecer na Rua Nova do Almada, no casinhoto abaixo do Tribunal da Boa Hora — não se deixem intimidar pelas sandes de panado, ali há mesmo li-mo-na-das. Para rematar, nada de sobremesas, porque se é para dar cabo de tudo procura-se uma Portugália e come-se uma taça de doce de ovos a sério e à séria, mesmo no Verão, ao balcão. Custa seis euros, é saboroso, tem um gosto natural. Para os fãs, também há no pão.

7 comentários:

AR disse...

Creio que acabei de escrever um post e pensei "isto é ao estilo Pudim Royal", et voilá. Cá estou.

Já me sinto melhor por saber que não sou a única que pesa mais 10 kilos do que há 4 anos!

Podias fazer um videolog para ilustrar os posts gastronómicos...e fdx, agora fiquei a esparregar da boca =P

Eu cá vou mazé criar o drinklog: hidromel.blogspot.com

maria disse...

Bem bons esses nacos de carne do h3....e passe a publicidade...os espinafres do pingo doce são cool.

bú disse...

Ai tanto apetite =)
Só falas de comida ultimamente *

Anónimo disse...

Não te sabia tão apreciador dos comes, mas vou apreciando esta tua faceta de bom contador de histórias.
Vê se apareces. Um abraço.

Cátia Simões disse...

a limonada do café inclinado, quase aposto que é verdadeira...

[é sempre um prazer ler-te]

maria disse...

hoje comi esparregado...e é bom que estejas atolado em trabalho para me andares a ignorar desta forma!!!!!

humpf.

AR disse...

quem ignora é ignorante.