sábado, 30 de dezembro de 2006

Não te incomoda que Saddam Hussein tenha sido enforcado?
Da felicidade
Em “Câmara Clara”, programa de Paula Moura Pinheiro, aqui com João Pereira Coutinho e Ana Martins. Este é um dos melhores programas em emissão na TV portuguesa. Ver aqui.

sexta-feira, 29 de dezembro de 2006

Tsunami, Tim Roth e deitar tarde
A mini-série de dois episódios “Tsunami, the aftermath”, com a chancela da HBO, passou insuspeita e a más horas em duas noites desta semana na SIC. Apesar do receio de que se tratasse de mais uma dramatização com base em testemunhos reais a atirar para a lamechice, foi por ter visto o Tim Roth no ecrã e pensar «ena, então este tipo ainda mexe?», que me demorei a ver partes de ambos os episódios. E surpreendi-me.

Roth interpreta o papel de um jornalista de agência, um dos primeiros a chegar ao local onde se passa a história, uma localidade costeira tailandesa. É um sujeito sujo, seboso e mal-cheiroso, muito curioso e com faro, que prefere deixar as histórias banais aos outros, que são todos, e procurar as suas. Até certo ponto da série tem um colega fotojornalista, nativo, e é com ele que se dá o primeiro de alguns choques provocados pelo jornalista: Roth quer fotografias dos corpos sendo cremados em templos budistas, corpos que não tinham sido identificados, e o colega recusa-se, por respeito aos monges, à sua religião, à sua cultura. Primeiro ponto de interesse: o choque de civilizações. O que se deve sobrepôr? A tradição da libertação das almas, que é também uma medida de salubridade, ou o procedimento legal, ocidental?, de esperar pela identificação daquelas vítimas e proporcionar-lhes uma viagem até casa e um enterro?

Adiante Roth apercebe-se de dois factos, que questiona a uma representante de cadeia hoteleira ocidental: porque ficaram de pé as palmeiras e os hotéis foram arrasados? e porque estão já em campo escavadoras e equipas de trabalho limpando escombros, alisando as praias onde antes estavam hotéis, escassos dias após o tsunami? Está apontado o dedo: os hotéis não passam de “palhotas”, construções precárias, baratas, inseguras, cujo valor único é o de estar erigidas nas praias do paraíso. Mais: o que importa é reconstruir, e se se puder sacar mais umas terras às vítimas locais que não deixem herdeiros, tanto melhor. Negam? Não negaram.

O diplomata inglês, tipicamente de calça beje e camisa azul claro, chegou ao local bastante atarantado e ainda soltou uns «arranjem-me um chá», «vamos montar a base no hotel» ou «precisamos de um escritório com ar-condicionado». Saudades do consulado… Com o tempo, lá assentou os pés na terra e percebeu que tinha era de fazer qualquer coisa pelos sobreviventes. Constata-se: ninguém está, estava, preparado para agir em conformidade com o que se passou.

Os turistas, aparte o drama de terem perdido alguns dos seus mais próximos e de quererem, a todo o custo, ser levados dali com os sobreviventes feridos, passaram um retrato daquele tipo de turismo, que acho fiel, nunca o tendo feito. Não falam a língua, não querem saber dos nativos — que são quem os serve, quem lhes arruma o quarto e as malas, etc — e não os ajudam naquela situação, que é em tudo semelhante à deles — a série lá se apoia no personagem de um rapaz tailandês, paquete de hotel, e único sobrevivente em toda a sua família, par mostrar o “outro lado” da tragédia. Os turistas acenam com o dólar, altivos, e querem que tudo aconteça num ápice. Os turistas, se são a subsistência daquele tipo de economias, são também nojentos. É bonito ir lá, estar lá enquanto tudo corre bem, mas ao primeiro odor a esturro é vê-los gritar e virar costas. A exploração destes povos que turistas e fornecedores ocidentais deste tipo de serviços fazem na Tailândia, em África, em Cuba, em tanto sítio, enoja-me um bocado.

E mais não vi.

sexta-feira, 22 de dezembro de 2006

Foi ou não foi Zé Carlos? Pssshhht cala-te!
No final do encontro com o primeiro-ministro turco, Recep Erdogan, este afirmou que o Papa lhe tinha dito: “Desejamos que a Turquia faça parte da União Europeia.” Mas o porta-voz do Vaticano, padre Federico Lombardi, corrigiu o que Bento XVI teria dito: “A Santa Sé olha positivamente e encoraja o caminho de diálogo, aproximação e integração” da Turquia na Europa, “na base de valores e de princípios comuns”.

sexta-feira, 15 de dezembro de 2006

Um Porto branco seco
Que se lembrasse, nunca lhe tinha acontecido uma mulher pedir-lhe o número de telefone. Muito menos ligar-lhe cinco minutos depois de ter saído. Rindo e convidando-o para um jantar, sexta-feira, na Casa do Algarve, no Chiado. Em grupo. Aceitou, claro. E deitou-se sorrindo, curioso.

Na tarde seguinte resolveu desafiá-la para uma odisseia vínica. O aniversário de Tiago, o amigo do peito, já tinha passado e ele não tinha conseguido comprar atempadamente o vinho que queria oferecer. Então reservou a tarde para correr algumas garrafeiras da cidade e quis levá-la consigo. Era um teste, sim. Conhecê-la um pouco melhor, os dois sozinhos num campo neutro, sem horários que não os do fecho das lojas, sem constrangimentos. Para ver que assuntos surgiam, para ver se ela gostava ser deixada passar primeiro, para ver como contribuía para o passeio sem programa, para ouvir o que dizia e de que forma reagiam os olhos dela aos seus filmes preferidos, discos repetidos, lugares mais queridos e se gostava do nome que ele já tinha escolhido para o primogénito, o que, aliás, era condição inegociável mas, descanse-se, pode não ser o primeiro nome. Para saber dela e dos seus. Para se mostrar, ele e os seus. E os sentimentos também.

Joaquim Pedro — e Pedro é apelido — era um rapaz introvertido até ficar confortável, até ficar seguro de si, até a falsa timidez desaparecer, que não era falsa porque fosse mentirosa, mas sim a primeira casca a sair logo que sentisse reciprocidade no contacto.

Começaram na Garrafeira de Campo de Ourique, ali próximo à rua Ferreira Borges. O bairro tinha gente, lojas de todos os tipos, eléctricos a passar, pastelarias à antiga e até uma vista sobre o rio, a ponte e o Cristo Rei. Se anoitecesse entretanto, as iluminações de Natal comporiam o cenário e nem estava muito frio. Quase perfeito. Só não o foi porque o vinho, que havia no armazém, como meia hora antes a mulher tinha afiançado, que podiam até ir beber um café e voltar logo para buscar, afinal não havia. Nem uma garrafa. «Eu sei que é desagradável perguntar, mas então e na concorrência? Pode indicar alguém aqui perto?...» Visivelmente melindrada, a mulher lá deu um número. «Pode ligar daqui», disse, virando o telefone do balcão na direcção de Joaquim. «Ora essa, não é necessário…» Quando ele saiu já Clara se ria, como aliás só ela, dona de um sorriso e de um riso encantadores, de tão genuínos.

Clara Menezes de Andrade, ou «Clara, como a água», que foi como se apresentou da primeira vez. Clara era da altura de Joaquim, tinha olhos castanhos e cabelo curto acima dos ombros, de uma cor acobreada, que Joaquim lamenta não conseguir descrever melhor, porque é manifestamente ignorante no assunto e as suas três irmãs têm todas o cabelo preto, a mãe é loira pintada, e mais longe que isso ele não vai. Acobreado, portanto. O corpo era robusto, pelo que Joaquim já tinha visto, embora não hoje, que Clara vestia um casaco cinzento até aos joelhos. Robusto no sentido oposto àqueles corpos franzinos de miúdas magras, mas não robusto de peso excessivo, nada disso. Seria mais na categoria de “ossos largos”, e por aqui se vê que Joaquim não é nenhum Eça e mete os pés pelas mãos nesta coisa das descrições. Contudo, não se duvide: era sensual, e não somente pelos seios pronunciados, como o Bernardo e outros dos seus amigos notavam, como que hipnotizados e bastante primários. As mãos — e Joaquim é um homem de mãos — eram grandes com dedos longos e para ele, numa palavra, bonitas. O resto, que era ainda o início, resumia-se assim: extrovertida, obstinada, noctívaga e louca a conduzir.

Antes tinham passado tempo numa pastelaria, de que nenhum recorda o nome, mas que tem um toldo verde e que fica numa esquina junto a um jardim. Que tem apenas três mesas com duas cadeiras cada, duas delas junto a janelas e a outra encostada a uma parede dos fundos. Dois balcões avançados até mais de meio da casa, duas senhoras e dois senhores atendendo, e reformados habituais comendo rapidamente e em pé. Bolos ou especialidades, não se sabe. Joaquim bebeu um café, cheio, e Clara um galão, que veio tão quente que escaldava os dedos e teve que ser mudado de copo. À mesa, falaram de percursos passados e da relação com os pais. Em boa verdade, falou sobretudo Joaquim, entusiasmado com as perguntas empenhadas que Clara lhe fazia. Aliás — e que fique registado —, foi ela quem puxou a conversa dos “ex” sem saber se havia alguma, porquanto não se conheciam tão bem, o que Joaquim interpretou, com bastante agrado, tratar-se de uma pergunta interessada.

Depois de caminhar pela rua e enquanto ele descobria ao telefone que a concorrência indicada pela mulher mal disposta também não tinha o vinho, Clara olhava modelos e fazia perguntas numa sapataria. No bairro há muitas e os sapatos são uma das suas predilecções. «Porque não tenho pezinhos de princesa é difícil encontrar o que me sirva e que eu goste», explicou. Não precisava, porque não aborrecia Joaquim. A paciência para compras com mulheres só lhe faltava em centros comerciais e quando a visita tinha esse único objectivo, que aí elas parecem sempre ligar um modo de funcionamento cego ao resto e magnetizado em provadores e coisas assim. «Tenho de voltar cá» foi a deixa que confirmou: ela tinha gostado.

«Disseram-me que na João XXI há uma boa garrafeira e é possível que tenham. Vamos lá?» Ela, mais prática, preferia telefonar a perguntar. Mas acedeu. Mais do que uma garrafa de Apitiv, um Porto branco seco da casa Sandeman, que Joaquim agora já sabe que deixou de ser produzido e a haver será apenas em fundos de stock, o que ambos procuravam era passar um bom pedaço de tempo.

Pelo caminho, no carro, e para além do susto que Clara apanhou quando um sujeito recuou incauto do mau estacionamento para o meio da rua e Joaquim guinou para a esquerda buzinando, mesmo entalado por um Audi prateado que vinha desejoso de o ultrapassar, falaram de música. O Rui Veloso é que escreveu que «não se ama alguém que não ouve a mesma canção» e se fossem por aí, Clara e Joaquim estavam tramados. Mas quem é que falou em amor? Por agora, esse é como o vinho: não há em lado nenhum.

terça-feira, 12 de dezembro de 2006

Koop @ Casino Lisboa
A proposta era atraente: os suecos Koop, em Lisboa, para rodar o novíssimo terceiro disco, “Islands”. Lá fui, ontem.

O espaço Arena Lounge do Casino Lisboa é muito acanhado e encheu rapidamente, por certo pela entrada gratuita. O que pôs a nú as más condições do local: a circulação de pessoas era extremamente difícil, como sardinhas em lata, sendo impossível mexer-se fosse para que lado fosse (óptimo, contudo, para engatar gajas… eu e a quarentona afiançamo-lo… e tenho testemunhas! :P), deixando antever que em caso de alguma emergência serão muitos os espezinhados e esmagados — num edifício moderno, senhores? caramba!... O som também estava baixo e mal ajustado às características dos instrumentos acústicos, sobretudo do contrabaixo. Mas lá ultrapassámos o desconforto, vendo a banda por detrás de uma escadaria, meio agachados…

Ao longo de hora e meia ouviram-se temas dos três álbuns, “Sons of Koop” (1997), “Waltz for Koop” (2002) e “Islands” (Nov 2006), numa performance muito equilibrada, quiçá sem grandes rasgos. Yukimi Nagano esteve muito bem, quase sem diferença vocal para os discos, entrando e saindo de palco conforme os temas. O baterista ainda solou, e bem. O homem do vibrafone foi preponderante. O contrabaixo perdeu pela má afinação do som. O trombonista prestou um bom serviço. A dupla de maestros Oscar Simonsson e Magnus Zingmark, não obstante os vestidinhos de alças e a maquilhagem à Conde Redondo, fez o que se lhe pedia: sem pregos, os samples foram entrando à hora certa, tudo bem equalizado e irrepreensível.

Ficam, no entanto, duas impressões. Primeira, falta aos Koop alguma garra de palco, não descartando a hipótese de o espaço esquisito (um palco elevado, como uma varanda) e a audiência dispersa por dois pisos e um bar, ter causado desconforto e impedido a ligação a recinto e público. Segundo, ter um conjunto de metais em palco, em vez de ter os segundos instrumentos samplados, seria sem qualquer dúvida uma grande mais-valia para o grupo.

Os Koop são mais um nome que reforça o que venho dizendo há anos: as escolas de jazz, música electrónica e experimentações fusionistas do Norte da Europa são do mais interessante que o jazz do velho continente tem para oferecer.

P.S.: Alguém exige que eu refira que ficou apaixonado pela Yukimi Nagano...

domingo, 10 de dezembro de 2006

«Arrastão mantém-se submerso em Setúbal»
Público, 07Dez2006

Depois de Carcavelos, os tipos estão só à espera que chegue o bom tempo e que a Trói(k)a do Belmiro esteja concluída, para atacarem de novo. Espertos.

sábado, 9 de dezembro de 2006

«Vendo-me manietada pelo capanga, deu-me dois estalos»
(…) Jorge e Carolina conheceram-se no Calor da Noite, casa de alterne do Porto onde a mulher de 22 anos tentava arranjar sustento para os dois filhos. Apaixonaram-se ao som de Sting, passaram a primeira noite juntos num hotel em Espanha e Carolina mostra no livro os bilhetes de amor que o presidente lhe escreveu: “Giorgio love Carolina”. E revela que gostava de frango com ovos e ‘cafuné’ para adormecer.

Só gostava de saber como foi possível a Rui Gustavo escrever isto (Expresso, 08Dez2006) por entre os espasmos de gargalhadas daquelas de rebolar no soalho. Ou não? Eu, pelo menos, dei espectáculo no café…

domingo, 3 de dezembro de 2006

Assim como quem assinala o terceiro aniversário do Pudim, que foi algures em Novembro, há novidades aí à direita. Poucas, mas há...

sábado, 2 de dezembro de 2006

Volta Pierce Brosnan, estás perdoado
Fui ver o «007 - Casino Royale» desprendido de preconceitos, sem expectativas e sem ter lido críticas. Resultado? Fraquinho.

Por muito que se tenha esforçado, Daniel Craig não conseguiu ser um Bond. Achei-o demasiado musculado, com um rosto muito duro, uma expressão de severidade — ou pretensa severidade? — muito marcada, com um puro sotaque inglês inexistente e um fato que simplesmente não lhe assenta. E a Bond girl também não me encheu as medidas... É gira e tal...

Por outro lado, os argumentistas e o realizador (?) deixaram cair trechos fundamentais num 007: então o James não quer saber se o seu Martini é mexido ou agitado? então a deixa “Bond, James Bond” aparece só no final? então o Aston Martin fica destruido — e muito bem destruido, diga-se, que a cena do capotamento é fenomenal — sem fazer uma perseguição digna desse nome? Pá...

Contudo, tenho que reconhecer que houve momentos em que o filme me prendeu. Mas... Pois.

Para mim há dois Bond: o Sean Connery e o Pierce Brosnan. E daqui não saio.