terça-feira, 31 de outubro de 2006
quinta-feira, 26 de outubro de 2006
Três quartos que ontem sairam da sala sorrindo
ou a continuação do (meu) DocLisboa
Há filmes que têm o dom de nos fazer sair da sala sorrindo. “La Consultation” é um deles. O clínico geral Luc Perino é tão mais que um médico e a medicina, como ele diz, é o bocal do funil onde desemboca toda a sociedade. Por isso ele é urologista, psicólogo, obstetra, ginecologista, pai e mãe, filho, conselheiro.
Com um sentido de humor refinado, Luc Perino dá vida ao que podiam ser histórias banais e algumas vezes tristes. A do esquizofrénico, a do jovem casal que vai ter um filho: «Está grávida? Então parabéns! Ou… ou não?». A da rapariga que chega com os sintomas e o diagnóstico e o tratamento já na ponta da língua: «Então adeus. Porque veio cá?». A da senhora de 76 anos que pensa em suicidar-se desde que foi viver para um lar de idosos, a do alcoólico que não tem na mulher o incentivo que diz precisar para parar de beber, a da rapariga que a uma semana das férias do call-center vai pedir um atestado de doença para semanas porque não aguenta mais o ritmo de trabalho: «Trabalha há um ano… Então e como vão ser os próximos 40?» A da mulher que o consulta para “ir às compras” com a sua extensa lista de prescrições: «Mais alguma coisa?».
O filme de Hélène de Crécy, incluido na competição internacional, foi visionado por um auditório a três quartos. Três quartos que ontem sairam da sala sorrindo. E isso é certo.
ou a continuação do (meu) DocLisboa
Há filmes que têm o dom de nos fazer sair da sala sorrindo. “La Consultation” é um deles. O clínico geral Luc Perino é tão mais que um médico e a medicina, como ele diz, é o bocal do funil onde desemboca toda a sociedade. Por isso ele é urologista, psicólogo, obstetra, ginecologista, pai e mãe, filho, conselheiro.
Com um sentido de humor refinado, Luc Perino dá vida ao que podiam ser histórias banais e algumas vezes tristes. A do esquizofrénico, a do jovem casal que vai ter um filho: «Está grávida? Então parabéns! Ou… ou não?». A da rapariga que chega com os sintomas e o diagnóstico e o tratamento já na ponta da língua: «Então adeus. Porque veio cá?». A da senhora de 76 anos que pensa em suicidar-se desde que foi viver para um lar de idosos, a do alcoólico que não tem na mulher o incentivo que diz precisar para parar de beber, a da rapariga que a uma semana das férias do call-center vai pedir um atestado de doença para semanas porque não aguenta mais o ritmo de trabalho: «Trabalha há um ano… Então e como vão ser os próximos 40?» A da mulher que o consulta para “ir às compras” com a sua extensa lista de prescrições: «Mais alguma coisa?».
O filme de Hélène de Crécy, incluido na competição internacional, foi visionado por um auditório a três quartos. Três quartos que ontem sairam da sala sorrindo. E isso é certo.
segunda-feira, 23 de outubro de 2006
Três bons filmes ou o (meu) DocLisboa até agora
DocLisboa 2006 termina no próximo domingo, 29 Out. Decorre na Culturgest.
“The Emperor’s Naked Army Marches On” foi a primeira agradável surpresa do DocLisboa. Neste documentário do japonês Kazuo Hara, filmado entre 1982 e 1987, somos levados a entrar na vida de Okuzaki Kenzo, soldado sobrevivente da II Guerra Mundial, do teatro de operações da Nova Guiné, e na sua obsessiva busca de provas que responsabilizem o império japonês por mortes obscuras de soldados seus compatriotas.
Na Nova Guiné, já no final do conflito, as tropas japonesas foram deixadas a morrer à fome, cenário que deu origem a episódios de canibalismo entre camaradas militares — os soldados rasos eram sacrificados. Ou então, dias depois de finda a guerra, soldados dados como desertores eram executados sem julgamento.
Kenzo procura oficiais na reforma, envelhecidos como ele, e arranca-lhes — sim, arranca, porque chega a usar a violência — depoimentos que confirmam as suas suspeitas.
São vários os aspectos que acho interessantes na fita. Por um lado os factos escabrosos que apresenta, e que eu desconhecia. Por outro, relembra o que é a guerra, qualquer guerra: horror indescritível. É também um estimulante retrato da complexa sociedade japonesa, embebida numa cultura imperial há milénios, complexidade essa que encontro na relação e respeito pelos espaços privados, ou na honradez dos extensos cumprimentos, ou no brio com que Kenzo pede desculpa àquele que momentos antes agrediu, ou na cuidadosa e respeitadora acção das autoridades quando são chamadas a intervir nos desacatos e manifestações solitárias que Kenzo promove.
“Logo Existo”, de Graça Castanheira, apresentou-se em estreia absoluta num Grande Auditório que creio ter esgotado. A minha expectativa pessoal acerca da fita era elevada. De facto, desde as declarações pretensiosas e arrogantes — e francas e realistas? — que ouvi da realizadora aquando do festival Panorama – Mostra de Documentário Português, em Janeiro último, que vinha esperando que as corroborasse com trabalho vivo. E isso aconteceu ontem, com “Logo Existo”. Tecnicamente excelente e irrepreensível, interessante na abordagem ao tema, maduro na realização, ao filme bati palmas com prazer.
“Logo Existo” parte de histórias de renascimento após acidente vascular cerebral e toca assuntos relacionados com o estudo da mente e a relação que com ele têm a religião e filosofia, incluindo ainda algumas notas informativas — à falta de melhor palavra… — sobre neurobiologia.
Pessoalmente, a fita agoniou-me em vários momentos. A possibilidade real de um AVC aos 30 anos assusta qualquer um, e a quem, por vezes, salta noites, bebe mais café que o estritamente necessário ao gosto, corre em horários, etc e tal, ainda dá mais motivos para pensar. Merece ser visto. (acredito que passe na TV em breve)
“Sisters in Law” chegou premiado a Lisboa. Prémio do público no festival de cinema documental de Amesterdão, prémio CICAE em Cannes, e nomeação para melhor documentário britânico nos British Independent Film Awards, tudo em 2005.
O filme de Florence Ayisi e Kim Longinotto retrata duas juristas camaronesas que executam a lei e a justiça num contexto marcado pela tradição, abuso e violência, sobre as mulheres e as crianças.
Agradou-me o olhar pelo emaranhado cultural (social, religioso), que espelha muitos dos países africanos, a questão do poder nas mãos das mulheres — não tendo ainda chegado à política, são elas que tocam o país para a frente nos cargos de poder que ocupam —, e o relembrar da desestruturação transversal que grassa em África.
O DocLisboa continua amanhã.
DocLisboa 2006 termina no próximo domingo, 29 Out. Decorre na Culturgest.
“The Emperor’s Naked Army Marches On” foi a primeira agradável surpresa do DocLisboa. Neste documentário do japonês Kazuo Hara, filmado entre 1982 e 1987, somos levados a entrar na vida de Okuzaki Kenzo, soldado sobrevivente da II Guerra Mundial, do teatro de operações da Nova Guiné, e na sua obsessiva busca de provas que responsabilizem o império japonês por mortes obscuras de soldados seus compatriotas.
Na Nova Guiné, já no final do conflito, as tropas japonesas foram deixadas a morrer à fome, cenário que deu origem a episódios de canibalismo entre camaradas militares — os soldados rasos eram sacrificados. Ou então, dias depois de finda a guerra, soldados dados como desertores eram executados sem julgamento.
Kenzo procura oficiais na reforma, envelhecidos como ele, e arranca-lhes — sim, arranca, porque chega a usar a violência — depoimentos que confirmam as suas suspeitas.
São vários os aspectos que acho interessantes na fita. Por um lado os factos escabrosos que apresenta, e que eu desconhecia. Por outro, relembra o que é a guerra, qualquer guerra: horror indescritível. É também um estimulante retrato da complexa sociedade japonesa, embebida numa cultura imperial há milénios, complexidade essa que encontro na relação e respeito pelos espaços privados, ou na honradez dos extensos cumprimentos, ou no brio com que Kenzo pede desculpa àquele que momentos antes agrediu, ou na cuidadosa e respeitadora acção das autoridades quando são chamadas a intervir nos desacatos e manifestações solitárias que Kenzo promove.
“Logo Existo”, de Graça Castanheira, apresentou-se em estreia absoluta num Grande Auditório que creio ter esgotado. A minha expectativa pessoal acerca da fita era elevada. De facto, desde as declarações pretensiosas e arrogantes — e francas e realistas? — que ouvi da realizadora aquando do festival Panorama – Mostra de Documentário Português, em Janeiro último, que vinha esperando que as corroborasse com trabalho vivo. E isso aconteceu ontem, com “Logo Existo”. Tecnicamente excelente e irrepreensível, interessante na abordagem ao tema, maduro na realização, ao filme bati palmas com prazer.
“Logo Existo” parte de histórias de renascimento após acidente vascular cerebral e toca assuntos relacionados com o estudo da mente e a relação que com ele têm a religião e filosofia, incluindo ainda algumas notas informativas — à falta de melhor palavra… — sobre neurobiologia.
Pessoalmente, a fita agoniou-me em vários momentos. A possibilidade real de um AVC aos 30 anos assusta qualquer um, e a quem, por vezes, salta noites, bebe mais café que o estritamente necessário ao gosto, corre em horários, etc e tal, ainda dá mais motivos para pensar. Merece ser visto. (acredito que passe na TV em breve)
“Sisters in Law” chegou premiado a Lisboa. Prémio do público no festival de cinema documental de Amesterdão, prémio CICAE em Cannes, e nomeação para melhor documentário britânico nos British Independent Film Awards, tudo em 2005.
O filme de Florence Ayisi e Kim Longinotto retrata duas juristas camaronesas que executam a lei e a justiça num contexto marcado pela tradição, abuso e violência, sobre as mulheres e as crianças.
Agradou-me o olhar pelo emaranhado cultural (social, religioso), que espelha muitos dos países africanos, a questão do poder nas mãos das mulheres — não tendo ainda chegado à política, são elas que tocam o país para a frente nos cargos de poder que ocupam —, e o relembrar da desestruturação transversal que grassa em África.
O DocLisboa continua amanhã.
sábado, 21 de outubro de 2006
Uma semana
Daquelas que são para esquecer ou recordar. Como a revista, que vai ficar na memória, sem qualquer dúvida. Um fecho improvável, trabalho violento, um gozo tremendo e uma aprendizagem de valor incalculável. Foi sempre assim, caramba. E a vós devo tudo isso.
Já à chuva quero cobrar o cinzentismo dos dias e do humor. Caraças, tinhas que chegar?! Ao menos o almoço com vista sobre o Tejo, num recanto bem catita da parte alta da baixa da cidade. E os doces algarvios, não os têm? Caricato, no mínimo.
“Paraíso Agora”, que já saiu das salas, foi um belo murro no estômago. Recorda-me um título que escrevi há dias: olhar de frente as contradições de Israel. Não esperei que aqueles suicidas tivessem o fim que tiveram, nem que o episódio da última ceia de Cristo fosse caricaturado, nem de achar a Lubna Azabal tão gira, nem que no final todos os intervenientes questionassem o acto em silêncio, nem que não houvesse qualquer sonorização aí, nem esperei que fossemos cinco na sala. Nem que a companhia fosse tão agradável. A repetir.
Não sei se gosto ou não daqueles cafés metidos burgueses, mas a esplanada coberta daquele à Guerra Junqueiro deu bastante jeito, não deu? Tínhamos tomado banho, não precisasses de comprar tabaco e falar das dúvidas. E eu sempre saciei o desejo com um falso pastel de nata.
Tu foste embora. Os meus horários, não é?... És um belo enigma.
Antes, a tua clarividência. Sempre pertinente e que sempre procuro. Há pessoas que amo, tu és uma delas. A sensação de possuir tal privilégio há já anos é muito, muito boa.
Para jantar desaconselho vivamente o Maio. A casa vem nos guias e isso dá direito a receber a conta que não foi pedida, para vagar mesa. E se há coisa que detesto é isso. Tudo estava impecavelmente confeccionado, e a torta de amêndoa é mesmo paradisíaca, mas tais preços por tal serviço, não. Perderam este cliente em estreia e todos os que conseguir demover. O euro acompanhado de “goodbye” sabe melhor que aquele acompanhando o “obrigado”? Bardamerda…
De microfone em punho, o fado no Bairro Alto. Todas, mas mesmo todas as casas, que a chuvinha miúda não meteu medo. Até porque, caramba, estávamos com a Tété. É, realmente, um mundo à parte.
No início da maratona no estúdio, o teu gesto. Surpreendeste-me. E deixaste-me curioso. Além de que me salvaste, verdadeiramente. E agora?
Mozart, em esforço para não adormecer sentado, e um quinteto de sportinguistas que se achava engraçado. Não, não me leiam mal: Mozart foi bom.
O Expresso chega-me, finalmente, às mãos. Gosto do papel e do formato. A Única parece-me, mais que nunca, uma Caras. E isso chateia-me. Vamos ao filme japonês?
Daquelas que são para esquecer ou recordar. Como a revista, que vai ficar na memória, sem qualquer dúvida. Um fecho improvável, trabalho violento, um gozo tremendo e uma aprendizagem de valor incalculável. Foi sempre assim, caramba. E a vós devo tudo isso.
Já à chuva quero cobrar o cinzentismo dos dias e do humor. Caraças, tinhas que chegar?! Ao menos o almoço com vista sobre o Tejo, num recanto bem catita da parte alta da baixa da cidade. E os doces algarvios, não os têm? Caricato, no mínimo.
“Paraíso Agora”, que já saiu das salas, foi um belo murro no estômago. Recorda-me um título que escrevi há dias: olhar de frente as contradições de Israel. Não esperei que aqueles suicidas tivessem o fim que tiveram, nem que o episódio da última ceia de Cristo fosse caricaturado, nem de achar a Lubna Azabal tão gira, nem que no final todos os intervenientes questionassem o acto em silêncio, nem que não houvesse qualquer sonorização aí, nem esperei que fossemos cinco na sala. Nem que a companhia fosse tão agradável. A repetir.
Não sei se gosto ou não daqueles cafés metidos burgueses, mas a esplanada coberta daquele à Guerra Junqueiro deu bastante jeito, não deu? Tínhamos tomado banho, não precisasses de comprar tabaco e falar das dúvidas. E eu sempre saciei o desejo com um falso pastel de nata.
Tu foste embora. Os meus horários, não é?... És um belo enigma.
Antes, a tua clarividência. Sempre pertinente e que sempre procuro. Há pessoas que amo, tu és uma delas. A sensação de possuir tal privilégio há já anos é muito, muito boa.
Para jantar desaconselho vivamente o Maio. A casa vem nos guias e isso dá direito a receber a conta que não foi pedida, para vagar mesa. E se há coisa que detesto é isso. Tudo estava impecavelmente confeccionado, e a torta de amêndoa é mesmo paradisíaca, mas tais preços por tal serviço, não. Perderam este cliente em estreia e todos os que conseguir demover. O euro acompanhado de “goodbye” sabe melhor que aquele acompanhando o “obrigado”? Bardamerda…
De microfone em punho, o fado no Bairro Alto. Todas, mas mesmo todas as casas, que a chuvinha miúda não meteu medo. Até porque, caramba, estávamos com a Tété. É, realmente, um mundo à parte.
No início da maratona no estúdio, o teu gesto. Surpreendeste-me. E deixaste-me curioso. Além de que me salvaste, verdadeiramente. E agora?
Mozart, em esforço para não adormecer sentado, e um quinteto de sportinguistas que se achava engraçado. Não, não me leiam mal: Mozart foi bom.
O Expresso chega-me, finalmente, às mãos. Gosto do papel e do formato. A Única parece-me, mais que nunca, uma Caras. E isso chateia-me. Vamos ao filme japonês?
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