terça-feira, 30 de agosto de 2005

Para variar...
...cinema europeu. De tanto bater o meu coração parou, directamente de França; Os edukadores, de Berlim. No King ou Monumental, em Lisboa.

quarta-feira, 24 de agosto de 2005

Basileia é a cidade mais quente da Suiça. No norte do país, cortada pelo Reno, ladeada por território alemão e francês, Basileia é uma antiga cidade industrial, com grande tradição na alquimia, a química de hoje e das grandes farmacêuticas. Porque o país é trilingue, Basileia pode ser Bale, em francês, ou Basel, em alemão e inglês. O turismo vende Basileia como a capital cultural da Suiça e a cidade alberga, de facto, cerca de 30 museus. Foi num deles que me deparei com O Português Emigrante, pintura de Georges Braque, datada de 1911. Agosto em Basileia, que mais pareceu Outono.


O Português Emigrante, 1911, Braque


O Kunstmuseum é o ponto de partida para qualquer périplo museológico pela cidade. Porque é o maior, porque a sua exposição permanente reúne todos os grandes nomes da história da pintura do velho continente, como Kandinsky, Picasso, Magritte, Chagall, Munch – onde pára O Grito? –, Gaugin, Van Gogh, Monet, Renoir, Manet, Cézanne, Degás, Delacroix, Bruegel – que assina um perturbador mas belíssimo O Triunfo dos Mortos, de 1569 (imagem grande) –, Miró, Dali e Matisse, entre outros.

O Triunfo dos Mortos, 1569, Bruegel


Foi lá que encontrei a exposição Covering the Real – art and the press picture, from Warhol to Tillmans, uma mostra sobre os media e a forma como é feita a cobertura de eventos que são notícia. Uma pérola.

Um trabalho de Sarah Charlesworth mostrava 45 primeiras-páginas de todo o mundo, do dia 21 de Abril de 1978, data em que o primeiro-ministro italiano Aldo Moro, que havia sido raptado e se cria morto, aparecia, afinal, vivo. Nas páginas tinha sido apagado todo o texto, ficando somente a fotografia alusiva ao evento e outras referentes a outras notícias (se as houvesse), bem como o título do jornal. O trabalho mostrava os diferentes enquadramentos feitos à mesma fotografia de agência, as diferentes localizações na página, tamanhos e destaque. Somente a imagem, sem contexto – para quem, como eu, a data nada dizia, só descobriria lendo o guia da exposição ou pesquisando. O que introduz uma série de questões, desde o mais imediato “porquê assim” do tratamento da imagem em cada periódico, até ao valor da imagem de imprensa por si só.


Neste mesmo tema, numa outra sala, eram projectadas fotografias recebidas em tempo real pela agência suíça Keystone. Somente as imagens, sem qualquer legenda, pela ordem aleatória em que chegavam à redacção. Sucediam-se sem intervalo de tempo predeterminado, que poderia durar dois minutos ou 30 segundos. As minhas notas:

- uma feira de livro algures num país asiático; pessoas folheiam livros numa longa banca, provavelmente de saldos;
- uma mulher vasculha caixotes numa venda de garagem ou mudança; América do Norte ou Latina;
- aviões da British Airways; uma porta de porão de carga aberta mostra apenas “british …ways”;
- incêndios num país tropical (é tudo verdejante); ou uma plantação de droga sul-americana que levou fogo;
- polícia indiana ou indonésia escolta um Volvo, em motas Suzuki de baixa cilindrada (250 ou 500 cm3);
- soldados… Kalashnikovs em punho;
- Durão Barroso :) na Comissão Europeia;
- (bandeira preta, branca e verde com um triângulo vermelho) uma coluna militar em carros civis;
- jovens turistas numa estação de comboio; nacionalidade imperceptível, dada a ausência de referências; os desenhos nas mochilas sugerem um encontro religioso;
- novamente a coluna militar em carros civis; Índia, Paquistão, Iraque?

A fotografia de imprensa, sem legenda, não tem valor? Não passa de uma fotografia banal? A verdade é que, sem legenda de qualquer espécie, apenas pude supor sobre o que ali via retratado. Acertei que os jovens turistas se deslocavam para o encontro religioso de Colónia, porque já havia ouvido falar disso. Mas os meus palpites sobre a nacionalidade dos soldados da coluna militar falharam em grande: a bandeira é da Jordânia. Tudo o resto e mesmo esta última não passou de imagens banais, sem qualquer significado. Quando vemos uma fotografia sem legenda tendemos a olhá-la demorada e atentamente; se a fotografia tiver legenda, acabamos por dar mais atenção à frase que à própria imagem, passando por ela como uma mera ilustração de suporte.

Para descortinar o seu significado, a fotografia de imprensa precisa, sempre, de texto: seja a peça/reportagem ou a legenda.

Porém, logo à entrada da exposição, no hall do terceiro piso do museu estava montada uma instalação de René Pulfer, artista da cidade. Sob o nome News, no chão estavam espalhados 24 pequenos ecrãs LCD, transmitindo a emissão de outras de tantas estações televisivas noticiosas, de diferentes continentes e fusos horários – sem SIC Notícias ou RTP-N.

Mas muito interessante e até engraçado era o trabalho do israelita Omer Fast. CNN Concatenated isolava dez mil palavras ditas por repórteres da estação, construindo-se um novo texto. O vídeo tendia a exprimir e questionar a autoridade – e o controlo, manipulação? – das notícias de televisão. «What the viewer realises is that news reports are riddled with stereotyped, endlessly repeated components that may not be immediately apparent but severely impair the media’s claim to impartiality, objectivity and adequacy.» As transcrições estão aqui.


Um pouco diferentes eram os trabalhos de Martha Rosler. Em Bringing the War Home: House Beautiful e In Vietnam, a nova-iorquina escolheu fotografias de guerra publicadas na revista Life, fazendo fotomontagens com cenas do quotidiano norte-americano.


O francês Bruno Serralongue cobriu o Encontro Intergaláctico contra o Neoliberalismo e para a Humanidade (1996), antecessor do Fórum Social Europeu, e a Cimeira Mundial para a Sociedade de Informação (2003) com uma câmara fotográfica de fole de formato 10x12cm.

De Andy Warhol estavam patentes quatro trabalhos de reprodução mecânica e alteração de fotografias de imprensa: Nine Jackies [Kennedy], Red Race Riot, Five Deaths Seventeen Times in Black and White e Suicide/Silver Jumping Man (tudo entre 1963 e 64).

No fim fica o arrependimento por não ter comprado o álbum/catálogo da exposição, por 60 francos suíços.

Enquanto terminava esta mostra, abria ao público na Fundação Beyeler a exposição René Magritte, a chave dos sonhos. Na mesma casa já se podia ver Picasso surrealista, 1924-1939. Do primeiro impressionaram-me especialmente The Titanic Days (1928), o cachimbo que não o é, The Treachery of Images (1928), The Ignorant Fairy (1950) – de que fiz uma leitura diferente: “a fé ignorante”; a vela é a fé; a fé não ilumina – e The Month of the Grape-harvest (1959) – tão actual: a janela da casa está aberta, todos nos olham lá de fora.

The Titanic Days

The Treachery of Images

The Ignorant Fairy

The Month of the Grape-harvest

De Picasso, para não me estender, apenas O Beijo (1931).

The Kiss

terça-feira, 9 de agosto de 2005

Ben Harper, o incompreendido
Ok, “o sentir vem primeiro”. Mas daí a dizer-se da música de Ben Harper que é essencialmente «muito de Verão (...) que se ouvem bem junto à praia ou na esplanada (...) não importa tanto as canções, que “são bonitas”, mas a forma como as canta, a emoção», isto é redutor.
(no Público de ontem; não linko porque não está disponível)

Ben Harper, caso de estudo pelo raro sucesso alcançado em Portugal - venha quando vier, seja em que sala ou palco for, enche sempre! - tem uma legião de fãs que o conheceu a meio da discografia e que não se preocupou em ver o que estava para trás. É certo que o próprio músico mudou, evoluiu num sentido diferente. Mas esquecer ou desconhecer Pleasure And Pain (1992), Welcome To The Cruel World (1994), Fight For Your Mind (1995) e The Will To Live (1997) e toda a politização da sua obra, é muito redutor.

É como dizer que a estrela vermelha na bateria dos Rage Against The Machine era pra enfeitar. “Fãzecos”...