eisdruxúla? nem nunca ouvi falá
Suspeito que o Malato também não e isso não faz dele menos homem. Mas eu também não o conheço. Eu nunca fui à televisão. O João já foi umas três vezes, tirando as outras em que participou como actor numa série. Destas três vezes foi fazer coisas sérias. Ontem, por exemplo, foi lá falar das notícias dos jornais. Acho que isto, acho que aquilo, gostei de ler isto e esta fotografia é muito boa porque. O João foi convidado porque faz filmes. É realizador. E é meu amigo. E enche-me de orgulho. Ele e outra malta, cá dos nossos, que fazem filmes com ele e sozinhos. Mas filmes dos bons, que eles não brincam em serviço. Como os taxistas. Gente séria. Faça oito, preciso do recibo, e ele escreve sete euros e cinquenta e cinco cêntimos. Eu sou um mãos largas. Esta noite deixei no bar do São Jorge cinquenta cêntimos, para facilitar os trocos. E não bebi mais uma cerveja por isso. Venha cá buscar daqui a pouco — iá, lembraste-te? Gosto de dar. Um pouco como o António Costa. O tipo agora mandou pintar de amarelo e rodear de pilaretes de plástico uma série de lugares de estacionamento para motas um pouco por toda a cidade. Agradecido. Ou agradado? Não, isso é como teria ficado se não tivesses cancelado o encontro à hora, depois de me ter virado do avesso para chegar, aliás, depois de ter chegado!, depois de uma maratona, depois de ter faltado a duas pessoas derivado da saída tardia e ter ficado chateado com isso, era mesmo o que me estava a apetecer, um chá frio e conversa à janela. Em vez disso, uma sande de panado ao balcão com dois motoristas e um brasileiro a ouvir o Malato da televisão. A resposta era ‘lâmpada’. Mas eu também me estou a cagar pró acordo ortográfico, portanto, estamos quites. Não volto a discutir gramática misturada com mostarda e cerveja. Mais mostarda do que cerveja, no bigode, próximo do nariz, que é onde a mostarda não pode estar.
Porra, tenho mesmo que ir buscar o relógio ao relojoeiro.
terça-feira, 21 de julho de 2009
Eu às vezes repito-me
Isto dos manifestos é como contar manifestantes nas ruas. Há um procedimento — não se lhe pode chamar método — que consiste em, de olho direito fechado, que melhora a mira, juntar um grupinho de dez cabeças e tentar reproduzi-lo pela mancha total de cabeças. Deu vinte grupinhos semelhantes ao primeiro? São duzentos manifestantes. Deu entre trinta e cinquenta? São cerca de quatrocentos. Deu bué e enchem assim tipo uma avenida? São cem mil e são professores. Falível, portanto. Um bocado como contar a malta que escreve e subscreve manifestos aos partidos políticos. E em pouco mais de um mês surgiram seis — o livro do Pedro Santana Lopes, “a cidade é de todos”, ed. Leya, não conta, ok? Seis manifestos ou cartas abertas, subscritos por vinte e oito economistas, por catorze intelectuais, por dezenas de personalidades ligadas à cultura, e hoje por mais de sessenta pessoas — arrisco reduzi-los a pessoas — que assinam uma “carta de católicos” aos partidos. Vistos os nomes, quando os há todos e não apenas aquilo das personalidades como fulano de tal, uma dúzia são repetentes e os outros são os primos convencidos ao jantar.
Os repetentes, os que assinam vários manifestos, são sempre ex-qualquer coisa, ex-ministro, ou actual-qualquer coisa, como deputado, geralmente deputado independente eleito nas listas do PS, professor universitário, presidente desta associação ou fundação, músico ou qualquer outra coisa que lhes dê relevância. São figuras com visibilidade e isso faz parte da lógica do manifesto. Ou então são os que chumbaram de ano, que há tempos que tentam chegar a algum lugar, sem sucesso. Invariavelmente estão ligados aos partidos. Mas são poucos e são sempre os mesmos. Há um mês estive no congresso da SEDES, essa referência pela antiguidade e por nunca se ter transformado em partido, por recolher um leque de personalidades de relevo, por publicar umas “tomadas de posição” e tal. O congresso tinha menos gente que algumas aulas daquelas cadeiras mesmo chatas lá na faculdade, onde nem reprovar por faltas era incentivo suficiente. Poucos, muito poucos. Poucos mas com peso, porque tudo estremece quando tomam posição. Mas poucos. E todos, ou quase todos, com uma coisa em comum: currículo no exercício da cidadania, quase sempre com início naquele pedaço da nossa história que foi o regime não democrático ou os tempos da transição — os tempos da urgência em ter posição, em agir, em fazer coisas. E já me estou a repetir.
Eu não tenho nada contra os manifestantes dos manifestos. Mesmo que sejam os mesmos dos partidos, das associações, dos blogues, das colunas nos jornais, dos espaços de debate e comentário nas televisões, de todo o espectro mediático, de toda a opinião publicada — não, nunca vi, nem sei bem se quero ver, o novo programa do Pacheco Pereira (ai jesus, vénia, não é?...) na SIC Notícias —, os mesmos das tertúlias, das palestras e das conferências, das apresentações de livros ao final da tarde, das inaugurações, dos comissariados, de tudo e de nada. Nada contra. É que, no final, se até eles ficarem quietos isto deixa de existir. Mas onde é que vocês estão, pá? Sim vocês. Onde é que nós estamos? Alguém quer fazer alguma coisa? Ninguém quer agitar esta merda? Está muito calor, é? Olha que no final até é divertido, porra...
Isto dos manifestos é como contar manifestantes nas ruas. Há um procedimento — não se lhe pode chamar método — que consiste em, de olho direito fechado, que melhora a mira, juntar um grupinho de dez cabeças e tentar reproduzi-lo pela mancha total de cabeças. Deu vinte grupinhos semelhantes ao primeiro? São duzentos manifestantes. Deu entre trinta e cinquenta? São cerca de quatrocentos. Deu bué e enchem assim tipo uma avenida? São cem mil e são professores. Falível, portanto. Um bocado como contar a malta que escreve e subscreve manifestos aos partidos políticos. E em pouco mais de um mês surgiram seis — o livro do Pedro Santana Lopes, “a cidade é de todos”, ed. Leya, não conta, ok? Seis manifestos ou cartas abertas, subscritos por vinte e oito economistas, por catorze intelectuais, por dezenas de personalidades ligadas à cultura, e hoje por mais de sessenta pessoas — arrisco reduzi-los a pessoas — que assinam uma “carta de católicos” aos partidos. Vistos os nomes, quando os há todos e não apenas aquilo das personalidades como fulano de tal, uma dúzia são repetentes e os outros são os primos convencidos ao jantar.
Os repetentes, os que assinam vários manifestos, são sempre ex-qualquer coisa, ex-ministro, ou actual-qualquer coisa, como deputado, geralmente deputado independente eleito nas listas do PS, professor universitário, presidente desta associação ou fundação, músico ou qualquer outra coisa que lhes dê relevância. São figuras com visibilidade e isso faz parte da lógica do manifesto. Ou então são os que chumbaram de ano, que há tempos que tentam chegar a algum lugar, sem sucesso. Invariavelmente estão ligados aos partidos. Mas são poucos e são sempre os mesmos. Há um mês estive no congresso da SEDES, essa referência pela antiguidade e por nunca se ter transformado em partido, por recolher um leque de personalidades de relevo, por publicar umas “tomadas de posição” e tal. O congresso tinha menos gente que algumas aulas daquelas cadeiras mesmo chatas lá na faculdade, onde nem reprovar por faltas era incentivo suficiente. Poucos, muito poucos. Poucos mas com peso, porque tudo estremece quando tomam posição. Mas poucos. E todos, ou quase todos, com uma coisa em comum: currículo no exercício da cidadania, quase sempre com início naquele pedaço da nossa história que foi o regime não democrático ou os tempos da transição — os tempos da urgência em ter posição, em agir, em fazer coisas. E já me estou a repetir.
Eu não tenho nada contra os manifestantes dos manifestos. Mesmo que sejam os mesmos dos partidos, das associações, dos blogues, das colunas nos jornais, dos espaços de debate e comentário nas televisões, de todo o espectro mediático, de toda a opinião publicada — não, nunca vi, nem sei bem se quero ver, o novo programa do Pacheco Pereira (ai jesus, vénia, não é?...) na SIC Notícias —, os mesmos das tertúlias, das palestras e das conferências, das apresentações de livros ao final da tarde, das inaugurações, dos comissariados, de tudo e de nada. Nada contra. É que, no final, se até eles ficarem quietos isto deixa de existir. Mas onde é que vocês estão, pá? Sim vocês. Onde é que nós estamos? Alguém quer fazer alguma coisa? Ninguém quer agitar esta merda? Está muito calor, é? Olha que no final até é divertido, porra...
domingo, 19 de julho de 2009
Eu nunca estive em Santo Tirso, eu ando a ler sobre cidades
Não sei se existe algum segredo para cozer bem camarões, mas prometo averiguar. Camarões é aquela coisa que eu até gosto de comer, se fritos com alho, ou cozidos e servidos com sal, limão e gelo, na esplanada aqui de casa, à tarde e acompanhados de cerveja gelada, mas que bem dispenso fazer. Um pouco como os bolos: comer sim, fazer não. Sei que há receitas simples e boas, mas mesmo assim. Depois, dá nisto: a minha avó fazia um bolo de leite que nunca mais comi, a minha mãe faz um de laranja que há anos não como e o de chocolate, grande e fofo, já só lhe recordo a imagem da forma quase a transbordar. A torta de laranja vai pelo mesmo caminho, mas desta sei que a receita do chefe Silva foi acrescentada de precioso saber e de um creme para o recheio que não lhe pertencia mas que se revelou imprescindível para o Natal. O Natal perdeu a cor, já não sei em que ano. Mas recordo-me de folhear Teleculinárias que custaram dois escudos e cinquenta centavos. Também não sei em que número está a receita da torta e em que noutro a do recheio. Nem tão-pouco onde estão as revistas. Mas tenho na memória que o salame de chocolate leva bolacha Maria da Triunfo e vinho do Porto na prata, e que o bolo de bolacha, para ser sério, se faz com manteiga. Já o arroz doce... bem, ando farto do que se vende no bar do senhor Rui, agora que voltei a comer por lá, e não esqueço o cheiro daquele que fazia a dona Regina. Também me recordo de a ver passar a roupa a ferro. Eu passo as minhas camisas a ferro. Ando é preguiçoso, ou então é do calor, e deixei de fazer as maratonas de domingo à noite, o que me obriga a engomá-las de manhã, meio à pressa. Engomar, que é como quem diz.
Adoro o teu sorriso. Ficava horas a olhar para ele. Sorrisos como o teu só existem nas cidades. Nas cidades onde as pessoas vivem e trabalham, onde andam a pé, onde se encontram e onde dão encontrões. A boa cidade é aquela de onde as pessoas saem para ir passear quando conscientemente não querem passear na cidade, porque na boa cidade as pessoas não saem para ir dormir a outro lado, nem chegam de fora pela manhã, porque é ali, na boa cidade, que vivem. A boa cidade é a cidade de Baudelaire, a cidade dos entusiastas, onde se baixam as defesas porque se sente em casa, onde se sendo entusiasta se entusiasma com o que se vê acontecer dentro daquela porta, por detrás daquela montra, naquela rua, naquele sítio àquela hora, sítios e pessoas que fazem a boa cidade, onde um pouco de caos humano nas ruas nos faz esbarrar contigo e com os outros, boa confusão sem buzinas nem fumos, ou pelo menos sem se estar dentro dos automóveis que buzinam e deitam fumo, boa confusão que cria laços onde se pode ser caçado, tropeçar, onde se pode ser curioso, onde se pode observar, provar, saborear. Não, eu não ando a ler manifestos autárquicos. Podia andar, mas não ando. E não ando só porque depois tinha de escrever que o Terreiro do Paço, aos domingos, é das pessoas mas o Martinho da Arcada tem as portas fechadas, ou tantas outras coisas — isto estava a correr tão bem.
Diz que em Santo Tirso há um doce, ou um bolo, não sei bem, porque nunca estive em Santo Tirso, que se chama limonete. Eu não conheço, mas vou tentar provar. Já tenho o mapa para chegar à confeitaria Moura.
Não sei se existe algum segredo para cozer bem camarões, mas prometo averiguar. Camarões é aquela coisa que eu até gosto de comer, se fritos com alho, ou cozidos e servidos com sal, limão e gelo, na esplanada aqui de casa, à tarde e acompanhados de cerveja gelada, mas que bem dispenso fazer. Um pouco como os bolos: comer sim, fazer não. Sei que há receitas simples e boas, mas mesmo assim. Depois, dá nisto: a minha avó fazia um bolo de leite que nunca mais comi, a minha mãe faz um de laranja que há anos não como e o de chocolate, grande e fofo, já só lhe recordo a imagem da forma quase a transbordar. A torta de laranja vai pelo mesmo caminho, mas desta sei que a receita do chefe Silva foi acrescentada de precioso saber e de um creme para o recheio que não lhe pertencia mas que se revelou imprescindível para o Natal. O Natal perdeu a cor, já não sei em que ano. Mas recordo-me de folhear Teleculinárias que custaram dois escudos e cinquenta centavos. Também não sei em que número está a receita da torta e em que noutro a do recheio. Nem tão-pouco onde estão as revistas. Mas tenho na memória que o salame de chocolate leva bolacha Maria da Triunfo e vinho do Porto na prata, e que o bolo de bolacha, para ser sério, se faz com manteiga. Já o arroz doce... bem, ando farto do que se vende no bar do senhor Rui, agora que voltei a comer por lá, e não esqueço o cheiro daquele que fazia a dona Regina. Também me recordo de a ver passar a roupa a ferro. Eu passo as minhas camisas a ferro. Ando é preguiçoso, ou então é do calor, e deixei de fazer as maratonas de domingo à noite, o que me obriga a engomá-las de manhã, meio à pressa. Engomar, que é como quem diz.
Adoro o teu sorriso. Ficava horas a olhar para ele. Sorrisos como o teu só existem nas cidades. Nas cidades onde as pessoas vivem e trabalham, onde andam a pé, onde se encontram e onde dão encontrões. A boa cidade é aquela de onde as pessoas saem para ir passear quando conscientemente não querem passear na cidade, porque na boa cidade as pessoas não saem para ir dormir a outro lado, nem chegam de fora pela manhã, porque é ali, na boa cidade, que vivem. A boa cidade é a cidade de Baudelaire, a cidade dos entusiastas, onde se baixam as defesas porque se sente em casa, onde se sendo entusiasta se entusiasma com o que se vê acontecer dentro daquela porta, por detrás daquela montra, naquela rua, naquele sítio àquela hora, sítios e pessoas que fazem a boa cidade, onde um pouco de caos humano nas ruas nos faz esbarrar contigo e com os outros, boa confusão sem buzinas nem fumos, ou pelo menos sem se estar dentro dos automóveis que buzinam e deitam fumo, boa confusão que cria laços onde se pode ser caçado, tropeçar, onde se pode ser curioso, onde se pode observar, provar, saborear. Não, eu não ando a ler manifestos autárquicos. Podia andar, mas não ando. E não ando só porque depois tinha de escrever que o Terreiro do Paço, aos domingos, é das pessoas mas o Martinho da Arcada tem as portas fechadas, ou tantas outras coisas — isto estava a correr tão bem.
Diz que em Santo Tirso há um doce, ou um bolo, não sei bem, porque nunca estive em Santo Tirso, que se chama limonete. Eu não conheço, mas vou tentar provar. Já tenho o mapa para chegar à confeitaria Moura.
quinta-feira, 9 de julho de 2009
Da bifana, ou como detesto que uma mulher me deixe pendurado
Uma bifana grelhada faz logo diferença. Não só porque é mais saudável, no que há de saudável numa bifana no pão, mas porque sabe diferente. Uma bifana para levar à grelha deve ser temperada com sal, uma pitada pouca de pimenta, alho esmagado e sumo de limão. Ah e tal o sumo de limão usa-se é no peru e noutras aves — aqui não há dogmas. Depois é levar à grelha, deixar corar e virar na hora certa, que é aquela antes de a bifana ficar seca, rija e estorricada. A grelha preserva o sabor. A grelha deve ser de arame, mas isto qualquer assador de verão já sabe. Evitem uma bifana mal passada, porque é porco e porque não sabe bem, mas nunca peçam “bem passada, se faz favor”, que isso é deitar por terra todos os cuidados anteriores. Também não se pode ceder à tentação de comprar bifana barata, e isto já fica à consideração dos players do sector — haverá poucas coisas piores que uma bifana cheia de nervuras ou de gordura, e se tiver dúvidas, senhor gerente, pense em si, na sua fominha, na hora avançada, e numa trinca à pitbull que não larga, não larga, não larga. Não é fixe. O papel do pão não pode ser desprezado. Não deve ser carcaça, não pode ser bola de mistura muito maçuda — neste blogue faz-se língua — e não deve ser torrado, mas deve, sim, ter pouco miolo que deve ser apenas aquecido e nem pensem em tostar a côdea, que isso estraga a fofura. É que há uma série de inconvenientes numa bifana estaladiça e um deles é a mostarda a espirrar, algo que é de evitar, sobretudo se tivermos em conta que a bifana antecede o cinema, o concerto, o teatro, os copos ou coisa que o valha na sua qualidade de refeição rápida, e para essas coisas todas convém ir impecável, mais ainda se não houve tempo para passar em casa para um duche depois de um dia de árduo labor. A mostarda, dizia, é de amores e por mim é bastante. Há quem não aprecie e eu respeito, assunto encerrado. Agora, não me dêem é mostarda sem rótulo, que eu não vou nessa. Com jeito pode juntar-se umas fatias de queijo flamengo — o edam é magro e aquele muito amarelo dos hambúrgueres serve para isso mesmo, hambúrgueres — e temos uma bifana com queijo, ou um ovo estrelado, bem passado, para a gema não emporcalhar tudo, ou ainda cebola levemente refogada, mas tudo separado, hein?!, uma bifana com cada coisa, bem entendido. A bifana acompanha-se com imperial e dois euros e sessenta, vá lá, dois euros e oitenta, é mais do que um preço aceitável. Nada disto acontece na Portugália, onde até a bifana mergulha no molho de manteiga. Tudo isto acontece na Bela Ipanema, o oásis em tempo de Indie Lisboa, de festa do cinema francês, brasileiro, africano, ou de um concerto, ao lado do São Jorge, caraças que já não vou conseguir jantar e estou super atrasado — calma. Fecha à meia noite, há que saber que a cozinheira só trabalha até às onze, e mesmo com casa cheia o serviço é rápido e simpático. Esqueçam, no entanto, o pastel de nata: a massa é grossa, pouco folhada, tem demasiada gordura, e o recheio sabe a Maizena — quem te avisa, teu amigo é. À confiança na sopinha de agrião. Pode pagar-se com senhas Euroticket. Para tirar o cheiro a alho, Sagres.
Uma bifana grelhada faz logo diferença. Não só porque é mais saudável, no que há de saudável numa bifana no pão, mas porque sabe diferente. Uma bifana para levar à grelha deve ser temperada com sal, uma pitada pouca de pimenta, alho esmagado e sumo de limão. Ah e tal o sumo de limão usa-se é no peru e noutras aves — aqui não há dogmas. Depois é levar à grelha, deixar corar e virar na hora certa, que é aquela antes de a bifana ficar seca, rija e estorricada. A grelha preserva o sabor. A grelha deve ser de arame, mas isto qualquer assador de verão já sabe. Evitem uma bifana mal passada, porque é porco e porque não sabe bem, mas nunca peçam “bem passada, se faz favor”, que isso é deitar por terra todos os cuidados anteriores. Também não se pode ceder à tentação de comprar bifana barata, e isto já fica à consideração dos players do sector — haverá poucas coisas piores que uma bifana cheia de nervuras ou de gordura, e se tiver dúvidas, senhor gerente, pense em si, na sua fominha, na hora avançada, e numa trinca à pitbull que não larga, não larga, não larga. Não é fixe. O papel do pão não pode ser desprezado. Não deve ser carcaça, não pode ser bola de mistura muito maçuda — neste blogue faz-se língua — e não deve ser torrado, mas deve, sim, ter pouco miolo que deve ser apenas aquecido e nem pensem em tostar a côdea, que isso estraga a fofura. É que há uma série de inconvenientes numa bifana estaladiça e um deles é a mostarda a espirrar, algo que é de evitar, sobretudo se tivermos em conta que a bifana antecede o cinema, o concerto, o teatro, os copos ou coisa que o valha na sua qualidade de refeição rápida, e para essas coisas todas convém ir impecável, mais ainda se não houve tempo para passar em casa para um duche depois de um dia de árduo labor. A mostarda, dizia, é de amores e por mim é bastante. Há quem não aprecie e eu respeito, assunto encerrado. Agora, não me dêem é mostarda sem rótulo, que eu não vou nessa. Com jeito pode juntar-se umas fatias de queijo flamengo — o edam é magro e aquele muito amarelo dos hambúrgueres serve para isso mesmo, hambúrgueres — e temos uma bifana com queijo, ou um ovo estrelado, bem passado, para a gema não emporcalhar tudo, ou ainda cebola levemente refogada, mas tudo separado, hein?!, uma bifana com cada coisa, bem entendido. A bifana acompanha-se com imperial e dois euros e sessenta, vá lá, dois euros e oitenta, é mais do que um preço aceitável. Nada disto acontece na Portugália, onde até a bifana mergulha no molho de manteiga. Tudo isto acontece na Bela Ipanema, o oásis em tempo de Indie Lisboa, de festa do cinema francês, brasileiro, africano, ou de um concerto, ao lado do São Jorge, caraças que já não vou conseguir jantar e estou super atrasado — calma. Fecha à meia noite, há que saber que a cozinheira só trabalha até às onze, e mesmo com casa cheia o serviço é rápido e simpático. Esqueçam, no entanto, o pastel de nata: a massa é grossa, pouco folhada, tem demasiada gordura, e o recheio sabe a Maizena — quem te avisa, teu amigo é. À confiança na sopinha de agrião. Pode pagar-se com senhas Euroticket. Para tirar o cheiro a alho, Sagres.
terça-feira, 7 de julho de 2009
Passaram duas semanas desde que te vi e o que eu queria mesmo era ser o Lourenço Viegas
Qual é o segredo de umas boas migas? O alho? O limão? O azeite? Os coentros? Faz hoje duas semanas que há umas migas óptimas no Sinal Vermelho. Ali tudo vai bem com migas. Fica no Bairro Alto, próximo da Severa. É perguntar. Eles são minhotos — e eu tenho má memória — e parece que isso é fundamental. Quer dizer, admito que a doutrina possa divergir neste ponto para o Alentejo, que os alentejanos também as sabem fazer. Se és alentejano e proprietário de um belo restaurante, faz-me umas migas e convida-me, a caixinha dos comentários está aí para isso. Agora, e para que não haja dúvidas, as sardinhas são algarvias. Como as cigarrilhas são cubanas e Partagas. É daquelas coisas. Até sardinhas eu como acompanhadas de umas migas daquelas. Menu de verão — e esta já dei de barato. Como a minha receita de ovos mexidos com cogumelos frescos, para comer à uma da manhã, que tenho espalhado por aí, e que n’A Travessa se chama ‘ovos mexidos com cogumelos selvagens’ e serve-se antes da perdiz, que custa uma pipa, mas vale tanto a pena. É que n’A Travessa, do Convento das Bernardas, tudo é bom, e o campeonato é outro, o das notas amarelas. Mas como dessas não há muitas para sair amiúde a Filipa teve uma bela ideia, que foi a ideia da Tânia, que está feita para um grupinho que experimente umas três entradas, uns três pratos e beba vinho a copo. Para petiscar ao domingo à noite está tudo estragado: só se sai de lá para fechar a casa. Na Taberna Ideal, na Rua da Esperança, quem sofre é a segunda-feira, não há fé que lhe valha. E como eu tenho má memória não recordo o nome, nem das entradas, nem daquela coisa de milho com bacalhau. Aliás, já nem sei se era milho e bacalhau. É por estas, e por outras, que nunca serei um Lourenço Viegas. O Lourenço Viegas é o crítico da Time Out. Se calhar é um gajo mais famoso que isso, mas eu não saberei. Eu não compro a Time Out, mas volta e meia aparece uma aqui em casa. Ao início, há um ano?, comprava. Tinha na memória, a mesma que é má, as críticas — eram mais crónicas, mas pronto — do Miguel Esteves Cardoso à volta de pratos, mercados, restaurantes e cozinhados, e o Lourenço Viegas fez-me comprar a revista só para voltar a ler excelente prosa sobre comida. Quer dizer, é de dias, como dos pratos. Mas, meu, gosto muito do teu trabalho. E já agora: alguma vez escreveste sobre O Melhor Bolo de Chocolate do Mundo? Que ideia é aquela da bolacha, ou do suspiro, a meio do bolo pá? O Melhor Bolo de Chocolate do Mundo ainda carece de uma segunda prova — será quando te levar uma fatia ao Carmo assim de surpresa, Cátia, está prometido — mas à primeira digo que, no limite, é o melhor de Campo de Ourique. Mais que isso é arriscar um bocado: como ir aos bolos da João XXI às três da manhã com um apetite gigante de pastéis de nata e esperar que sejam bons. Lá está, é arriscar. Por outro lado, seguro seguro é o croissant doce do Careca. Pequeno, quentinho, o açúcar por cima meio derretido, com queijo e manteiga e um copo de leite frio, só para o lanche, que de manhã é uma bomba e pode até enjoar, e o croissant do Careca não merece isso. Para enjoadinho já basta o dono, um tal de senhor António, raça do homem. Rua de Pedrouços e tal, virar à direita no coiso — se não der é porque são betos e vêm de Cascais, e então é à esquerda — e procurar o toldo a dizer ‘pastelaria do Restelo’. Sim, eu sei, fui ao engano várias vezes. E limpem a baba porque à terça-feira está fechado. Já o Rosa Doce não fecha. Quer dizer, deve fechar, mas deve ser praí ao domingo. Portanto, hoje de manhã é de aproveitar. O melhor croissant de Lisboa é ali, com queijo, com fiambre, misto, a acompanhar com sumo de laranja. Não é folhado, não é massudo — eu acho que isto não existe —, é meio por meio. De passagem pela João XXI vale a pena. O João XXI é o Papa português, o Pedro Hispano, que morreu algures no século XIII — já disse acima que a memória é má — quando um tecto de uma igreja lhe caiu em cima. Obras sem projecto licenciado dá nisso. Costa? Santana? Em Outubro estou lixado, é o primeiro ano que voto em Lisboa, caraças. Olha lá, e tu não achas que duas semanas é muito tempo? Vê lá se dizes alguma coisa. Bem, mas porque é Verão e se a sede apertar, bebam água. Não vale a pena pedir dois sumos naturais no Frutalmeidas porque o docinho, o docinho da fruta, bem entendido, só dificulta. O truque é mesmo beber os dois copos de suminho — acontece-me quase sempre não conseguir ir embora ao fim do primeiro — e o terceiro copo, cinco ou dez minutos depois, ser de água. Confiem em mim. Se, como eu, acharem que um euro e quarenta por um copo de sumo de laranja é muito, e se acharem, como eu, que o que se cobra por um copo de sumo de laranja em Lisboa ou em Portugal é insultuoso, porque diz que neste país se produzem das melhores laranjas de que há palato, que são vendidas ao desbarato pelo produtor, então anotem: dois euros por um sumo de morango não é mal empregue; o sumo de ameixa, que não há sempre, é muita bom; o de pêra é um clássico — percebem a necessidade do copo de água? — e depois é ao gosto do freguês, não há que enganar. E os pastéis de massa tenra? Sim, fazem um bocado de azia, mas são porreiros. Mas porquê o que é ‘porreiro’ quando se pode ter o que é mesmo bom? Antes de dormir: leitinho, meio gordo, fresco; um copo; para beber a tragos espaçados. Se não gostas de leite podes voltar ao início desta crónica e não começar a ler. Na minha cozinha mando eu.
Qual é o segredo de umas boas migas? O alho? O limão? O azeite? Os coentros? Faz hoje duas semanas que há umas migas óptimas no Sinal Vermelho. Ali tudo vai bem com migas. Fica no Bairro Alto, próximo da Severa. É perguntar. Eles são minhotos — e eu tenho má memória — e parece que isso é fundamental. Quer dizer, admito que a doutrina possa divergir neste ponto para o Alentejo, que os alentejanos também as sabem fazer. Se és alentejano e proprietário de um belo restaurante, faz-me umas migas e convida-me, a caixinha dos comentários está aí para isso. Agora, e para que não haja dúvidas, as sardinhas são algarvias. Como as cigarrilhas são cubanas e Partagas. É daquelas coisas. Até sardinhas eu como acompanhadas de umas migas daquelas. Menu de verão — e esta já dei de barato. Como a minha receita de ovos mexidos com cogumelos frescos, para comer à uma da manhã, que tenho espalhado por aí, e que n’A Travessa se chama ‘ovos mexidos com cogumelos selvagens’ e serve-se antes da perdiz, que custa uma pipa, mas vale tanto a pena. É que n’A Travessa, do Convento das Bernardas, tudo é bom, e o campeonato é outro, o das notas amarelas. Mas como dessas não há muitas para sair amiúde a Filipa teve uma bela ideia, que foi a ideia da Tânia, que está feita para um grupinho que experimente umas três entradas, uns três pratos e beba vinho a copo. Para petiscar ao domingo à noite está tudo estragado: só se sai de lá para fechar a casa. Na Taberna Ideal, na Rua da Esperança, quem sofre é a segunda-feira, não há fé que lhe valha. E como eu tenho má memória não recordo o nome, nem das entradas, nem daquela coisa de milho com bacalhau. Aliás, já nem sei se era milho e bacalhau. É por estas, e por outras, que nunca serei um Lourenço Viegas. O Lourenço Viegas é o crítico da Time Out. Se calhar é um gajo mais famoso que isso, mas eu não saberei. Eu não compro a Time Out, mas volta e meia aparece uma aqui em casa. Ao início, há um ano?, comprava. Tinha na memória, a mesma que é má, as críticas — eram mais crónicas, mas pronto — do Miguel Esteves Cardoso à volta de pratos, mercados, restaurantes e cozinhados, e o Lourenço Viegas fez-me comprar a revista só para voltar a ler excelente prosa sobre comida. Quer dizer, é de dias, como dos pratos. Mas, meu, gosto muito do teu trabalho. E já agora: alguma vez escreveste sobre O Melhor Bolo de Chocolate do Mundo? Que ideia é aquela da bolacha, ou do suspiro, a meio do bolo pá? O Melhor Bolo de Chocolate do Mundo ainda carece de uma segunda prova — será quando te levar uma fatia ao Carmo assim de surpresa, Cátia, está prometido — mas à primeira digo que, no limite, é o melhor de Campo de Ourique. Mais que isso é arriscar um bocado: como ir aos bolos da João XXI às três da manhã com um apetite gigante de pastéis de nata e esperar que sejam bons. Lá está, é arriscar. Por outro lado, seguro seguro é o croissant doce do Careca. Pequeno, quentinho, o açúcar por cima meio derretido, com queijo e manteiga e um copo de leite frio, só para o lanche, que de manhã é uma bomba e pode até enjoar, e o croissant do Careca não merece isso. Para enjoadinho já basta o dono, um tal de senhor António, raça do homem. Rua de Pedrouços e tal, virar à direita no coiso — se não der é porque são betos e vêm de Cascais, e então é à esquerda — e procurar o toldo a dizer ‘pastelaria do Restelo’. Sim, eu sei, fui ao engano várias vezes. E limpem a baba porque à terça-feira está fechado. Já o Rosa Doce não fecha. Quer dizer, deve fechar, mas deve ser praí ao domingo. Portanto, hoje de manhã é de aproveitar. O melhor croissant de Lisboa é ali, com queijo, com fiambre, misto, a acompanhar com sumo de laranja. Não é folhado, não é massudo — eu acho que isto não existe —, é meio por meio. De passagem pela João XXI vale a pena. O João XXI é o Papa português, o Pedro Hispano, que morreu algures no século XIII — já disse acima que a memória é má — quando um tecto de uma igreja lhe caiu em cima. Obras sem projecto licenciado dá nisso. Costa? Santana? Em Outubro estou lixado, é o primeiro ano que voto em Lisboa, caraças. Olha lá, e tu não achas que duas semanas é muito tempo? Vê lá se dizes alguma coisa. Bem, mas porque é Verão e se a sede apertar, bebam água. Não vale a pena pedir dois sumos naturais no Frutalmeidas porque o docinho, o docinho da fruta, bem entendido, só dificulta. O truque é mesmo beber os dois copos de suminho — acontece-me quase sempre não conseguir ir embora ao fim do primeiro — e o terceiro copo, cinco ou dez minutos depois, ser de água. Confiem em mim. Se, como eu, acharem que um euro e quarenta por um copo de sumo de laranja é muito, e se acharem, como eu, que o que se cobra por um copo de sumo de laranja em Lisboa ou em Portugal é insultuoso, porque diz que neste país se produzem das melhores laranjas de que há palato, que são vendidas ao desbarato pelo produtor, então anotem: dois euros por um sumo de morango não é mal empregue; o sumo de ameixa, que não há sempre, é muita bom; o de pêra é um clássico — percebem a necessidade do copo de água? — e depois é ao gosto do freguês, não há que enganar. E os pastéis de massa tenra? Sim, fazem um bocado de azia, mas são porreiros. Mas porquê o que é ‘porreiro’ quando se pode ter o que é mesmo bom? Antes de dormir: leitinho, meio gordo, fresco; um copo; para beber a tragos espaçados. Se não gostas de leite podes voltar ao início desta crónica e não começar a ler. Na minha cozinha mando eu.
Goodbye Amélie
O Fabuloso Destino de Amélie Poulain? Goodbye Lenin? Esquece tudo. Nasceu o rock. Yann Tiersen agora é rock. O violino tocou três vezes e não mais de uns três minutos sem distorção. Agora é tudo guitarras. Que pinta.
- Moço, tenho um bilhete.
A que horas é?
- Nove.
Oito e meia lá?
- Oito e quarenta e cinco.
Feito.
- Compra-me uns rissóis.
(depois de sair no jornal republico a crítica do Rui. o Rui é o homem que perdeu o Cem Anos de Solidão na primeira jornada do inter-rail e isso diz tudo de bom sobre o texto que ele vai escrever)
O Fabuloso Destino de Amélie Poulain? Goodbye Lenin? Esquece tudo. Nasceu o rock. Yann Tiersen agora é rock. O violino tocou três vezes e não mais de uns três minutos sem distorção. Agora é tudo guitarras. Que pinta.
- Moço, tenho um bilhete.
A que horas é?
- Nove.
Oito e meia lá?
- Oito e quarenta e cinco.
Feito.
- Compra-me uns rissóis.
(depois de sair no jornal republico a crítica do Rui. o Rui é o homem que perdeu o Cem Anos de Solidão na primeira jornada do inter-rail e isso diz tudo de bom sobre o texto que ele vai escrever)
Subscrever:
Mensagens (Atom)