sexta-feira, 18 de novembro de 2005

Quinze euros paga-se por um livro
Eu gastei-os numa agenda. Comprei um diário Moleskine, de formato A5, muito pseudo-intelectual, para anotar tarefas, ideias para textos [sim, que pretensioso], pensamentos e outras coisas. Encaro-o como o ponto de partida para uma nova etapa. Tal como a música que ouço agora me sugere, hunted by a freak, de Mogwai. A primeira página é em 2006, mas comecei hoje.

Os produtos Moleskine vendem a imagem de Hemingway, a preço alto. É-me indiferente. O que gosto neste diário começa na encadernação, porque detesto argolas, e termina na côr do papel, amarelada. Uma agenda tem que ter capa dura, como esta, que é preta, e ser grande o suficiente para entre páginas guardar bilhetes de cinema, cartões de visita, postais, folhas com anotações ou mapas de museus, até CDs e seja mais o que for que chegado a Dezembro lhe dê o dobro da espessura. Como esta.

O elástico que a envolve a todo o comprimento é dispensável, mas é uma marca. A fita marcadora interior é útil, mas prefiro o que a Vanessa me fez, já não sei há quanto tempo, e que me tem acompanhado desde então.

As páginas reservadas a endereços não me fazem falta. O envelope colado no verso da contracapa é útil.

Gosto da ideia de oferecer uma recompensa a quem encontrar este caderno perdido, uma das originalidades dos produtos da marca, e que é o que reforça a ligação entre o usufruente e o produto, uma vez que reconhece a importância e o valor que este tem para o seu dono — não é uma agenda; é um pedaço de si.

As folhas são finas e agradáveis ao toque, além de não nos roubarem espaço com coisas que não interessam, como as horas, impressas a corpo pequeno e discreto, como devem ser. Porque a hora é o que menos interessa, juntamente com linhas verticais, que não as há. Há apenas um jogo de linhas para ajudar a escrever direito. É a horizontalidade que faz sentido.

Preciso fechar portas. Tenho vivido neste eixo cartesiano de x e y, horizontal e vertical, procurando traçar-lhe uma linha de progressão geométrica. Este ciclo vicioso do “depois”, que faz depender o objectivo de um desejo do que se há-de ter e então sim, é totalmente errado.

Viver em antecipação não é sistema. O controlo total é impossível. O risco é necessário. O desconhecido não é sempre mau.

1 comentário:

Anónimo disse...

"O controlo total é impossível."

E ainda bem. O estoicismo ata-nos, coarcta-nos a existência, a liberdade, os movimentos. Ainda que necessitemos e gostemos de agendas e com elas nos identifiquemos, como espelho do nosso dia-a-dia, da nossa transitoriedade preenchida e com sentido. Ou talvez não. Mas só às vezes.

Partilho o gosto pelas agendas. Pela sua configuração, pela sua cor (sem acento circunflexo), pelo seu tamanho, pelo que têm em cada ano de semelhante e unificador em relação às anteriores; pelo que possuem de diferente, de novo, mas igualmente reflexo de projecção do que faço, dos amigos que encontro, dos compromissos que assumo, das vitórias que conquisto e que aí ficam anualmente registadas.

As agendas têm também, para mim, uma dimensão diarística. De registo do que efectivamente acontece, obviamente agendado com antecedência, mas que se cumpriu. Caso contrário, será apagado. Por isso só escrevo a lápis na minha agenda que, tal como eu, zela pela escrita, pelo seu cuidado, e não suporta ser riscada a tinta. Perfeccionista como eu?