terça-feira, 9 de dezembro de 2003

O(s) sentimento(s) de um ocidental
Falta um quarto de hora para as nove da manhã mas há já um rol de coisas que me acirram e provocam aquele ardor à boca do estômago. É a chuva, são os grunhos no Metro, é o frio de manhã e uma casa-de-banho sem aquecimento, é aquele compromisso que agora tem lugar sem que eu esteja presente, porque assim o escolhi. E sou eu, sobretudo eu. E este desencontro comigo – que teimo em perpetuar?

Os dias que fui passar fora não ajudaram quanto eu queria. Recordando o que uma leitura habitual me ofereceu esta sexta-feira, “há muito mais coisas que valem a pena do que as pequenas coisas que nos ocupam tempo demais e nos maçam, nos enchem, nos envelhecem sem lógica nem razão.” É assim, realmente. Por isso foi tão bom estar àquela mesa mais uma vez, a teu lado, partilhando a alegria de mais um aniversário que, no fundo – e porque o teu é em Dezembro –, marca mais um ano de amizade. E como sabemos quanto isso é importante. (Ele não esteve, mas soubemo-lo connosco)

Acordei um dia depois e trezentos quilómetros mais a sul, na companhia de uma miúda que tudo me quer e de um alemão que come arenque pela manhã. Na simplicidade de um dia que nasceu bonito, visitei família e fui cheirar o mar, na praia, ao frio. Não faltou o cão nem o jovem casal que mostrava as maravilhas de um quase Inverno ao seu rebento, embarretado até às orelhas. Terminei com um repasto superiormente cozinhado com aquele capricho nórdico, regado com um vinho alentejano de selo alemão – nunca português, porque cá há sempre algum subsídio.

Regressado à urbe, a dependência na prosa electrónica presenteou-me com uma novidade desagradável, que custo a digerir ainda, não sei muito bem porquê – mas trouxe-te o cachecol, não vá ser por isso… Deste-me atenção, ouviste-me, mostraste-te e eu – sem nunca esquecer o contexto e o que isso significa – fui abrindo o meu casaco, deixando entrar o ar e que visses o que trazia vestido. Mas volto a subir o fecho até ao pescoço, porque arrefeceu repentinamente. E porque não te quero resfriada.

São agora exactamente nove e meia da manhã e em cima desta mesa estão os meus cotovelos e o copo de água vazio – a chávena de café, já a ucraniana levou.

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