segunda-feira, 29 de dezembro de 2003

“Depois, num daqueles acessos de lucidez que aproveitam uma rara aberta no entupimento alcoólico para se precipitarem em direcção às cordas vocais antes de serem apanhados na confusão, tal é a ganância patética de serem exprimidos, não vá nunca mais surgir a ocasião apropriada, alinhavou uma frase inteira e, para mais, correctíssima: «Até para a maionese, a minha avó usava um bocadinho de azeite e um bocadinho de óleo Fula… É verdade, Benza-a Deus!»”

um habitual

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“Suponhamos que vejo diante de nós uma rapariga de modos masculinos. Um ente humano vulgar dirá dela, «Aquela rapariga parece um rapaz». Um outro ente humano vulgar, já mais próximo da consciência de que falar é dizer, dirá dela, «Aquela rapariga é um rapaz». Outro ainda, igualmente consciente dos deveres da expressão, mas mais animado do afecto pela concisão, que é a luxúria do pensamento, dirá dela, «Aquele rapaz». Eu direi, «Aquela rapaz», violando a mais elementar das regras da gramática, que manda que haja concordância de género, como de número, entre a voz substantiva e a adjectiva. E terei dito bem; terei falado em absoluto, fotograficamente, fora da chateza, da norma, da quotidianidade. Não terei falado: terei dito.”

uma redescoberta

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