O inspector Malarranha, homem vivido, polícia experiente e da velha guarda, faz tudo com as mãos – “toco guitarra, escrevo à máquina, bato punhetas” – e a um dia da reforma, quando a barriga descreve já aquela curva trabalhada e quase perfeita, depara-se com a queixa de uma bailarina de casino, vítima de bofetada e tentativa de fim-de-semana-na-cama em Albufeira. Puxando de uma cigarrilha creme, que degusta com classe em bafejos sabidos, interessa-se pela estória, que acaba por desvendar, contudo, não a tempo de impedir uma tragédia – “e podiam ter sido quatro, se o guarda-redes não tem encarrilhado”.
É, de resto, quem encabeça e salva «Os Imortais», o mais recente filme de António Pedro Vasconcelos, um argumento mediano, onde não faltou a ponte com as províncias ultramarinas e o drama daqueles que por lá ceifaram vidas – a deserção de Abel, “esta terra não é nossa, pá; é deles!”, coloca o ponto no “i”. Bem filmado, não fora a falta de racord nos 40 anos de serviço que subitamente passam a 35, o cancro que é o Joaquim de Almeida ou aquele quarto de hora excedentário no deslinde do enredo, e a fita até ficava equilibrada... Como não, apenas o inspector sobressaiu, mesmo apesar do francês à Camarinha.
“Tá tudo preso, seus cabrões!” e o ex-Bar-da-TV Hodji Fortuna até fez uma perninha no filme, como Matateu, o preto que desapareceu tão rapidamente do ecrã como da cena jet-famosa nacional. Mas outros estiveram bem. Por exemplo, o colega substituto “oh Figueiredo, leve-me daqui esta merda”, a puta diplomática sem celulite Madame Duran, a companheira e colega Filó.
Destaco também a cena do balcão de tasca, onde o inspector observa na TV o Carlos Fino reserva-especial-de-‘85, bebericando uma imperial enquanto procura, com perícia e sem olhar, o prato dos tremoços, que petisca a compasso bem estudado – Escadinhas do Duque às seis da tarde ou qualquer outra tasca lisboeta e estão a ver a cena...
“Tu também, meu cabrãozinho” e como a filha Ruef passou a noite fora de casa o inspector nem uma torrada comeu! Resulta que é fufa e mudou-se para a casa da mulher do Beto, por Alexandra Lencastre – mas... fufa?! –, o que é caso para dizer “foda-se, foda-se, foda-se, foda-se” e atirar as cigarrilhas ao chão!
Numa Lisboa recheada de Datsuns, guitarradas e Mafalda Arnauth cantando numa casa de fados, lembrando-me as imagens a preto-e-branco de um filme com Amália, que nunca vi. Aquele sujeito que representa anedotas no programa diário da SIC também participa mas, não sei se da falsa gaguez se de outra razão qualquer, faz porra nenhuma e sem qualquer jeitinho. Ai a Patrícia Vasconcelos e aquele casting...
Unas esteve ok mas sem espaço, Samora já fez melhor mas, verdade seja dita, o papel não lhe exigiu muito, e a cena de sexo “eu sou a tua puta, eu sou a tua puta” cumpriu com o dogma do machismo no pseudo erotismo/tentativa de soft-porno ao estilo “Orquídea Selvagem” do cinema português.
Mas foi muito bom ver o Nicolau Breyner. O papel assenta-lhe como uma luva, o actor também parece desempenhá-lo com prazer e nunca um “foda-se” fez tanto sentido.
“Ai os imortais, os imortais...”
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário